segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Das releituras

Já ninguém escreve cartas. Eu, sou-lhe sincero, sinto saudades do tempo em que as pessoas se correspondiam, trocando cartas, cartas autênticas, em bom papel, ao qual era possível acrescentar uma gota de perfume, ou juntar flores secas, penas coloridas, uma madeixa de cabelo. Sofro uma nostalgia miúda desse tempo em que o carteiro nos trazia as cartas a casa, e da alegria, do susto também, com que as recebíamos, com que as abríamos, com que as líamos, e do cuidado com que, ao responder, escolhíamos as palavras, medindo-lhes o peso, avaliando a luz e o lume que ia nelas, sentindo-lhes a fragrância, porque sabíamos que seriam depois sopesadas, estudadas, cheiradas, saboreadas, e que algumas conseguiriam, eventualmente, escapar à voragem do tempo, para serem relidas muito tempo depois.

José Eduardo Agualusa, O Vendedor de Passados

2 comentários:

tsiwari disse...

Ainda hoje ouvia uma senhora, cuja filha está por uns tempos nos USA, dizer :

- Se ao menos me escrevesse uma carta...

E, note-se, fala com ela muitas vezes! A carta tem outro valor, outro peso, outro significado...

***

Vitor disse...

eu não escrevo cartas, mas deixo uns post´its de vez em quando junto à máquina do café...

beijo azul...

PS: magnólias ? roubo-as nos jardins vizinhos para oferecer...